domingo, 22 de maio de 2016
Atividades ortográficas.
ATIVIDADES
ORTOGRÁFICAS
EXERCÍCIO 01
01. Complete os
espaços das frases com: POR QUE, POR QUÊ, PORQUE ou PORQUÊ:
a)
________ele sumiu da aula mais cedo?
b)
Não fui à festa________choveu.
c)
Eles estão revoltados, ______________?
d)
Quero saber o___________ do seu medo?
e)
Ele não procurou,________?
f)
Ninguém explicou o ________ de sua desistência.
g)
Desejo saber _________não compareceu à aula?
h)
___________é sonhador o jovem cultiva ideias.
i)
A criança adoeceu________brincou na água quente.
j)
__________você não tirou os pães do forno logo?
k)
O pedreiro não terminou de colocar a cerâmica da
casa, _________?
l)
O_________da minha insônia é a preocupação com as
contas atrasadas.
m)
Vamos sair mais cedo da aula hoje________o
professor faltou.
02. Complete os
espaços usando MAS ou MAIS nos espaços:
a) Os alunos queriam
______aula de Matemática.
b) Enquanto______, melhor.
c) Comprei um carro,
______não sei dirigir.
d) Você tirou 10 na prova,
______ainda foi reprovado.
e) A moça é ________bonita
quando gosta de estudar.
f) Esta mulher sempre
gasta _______dinheiro com unhas e cabelos do que com as despesas da casa.
g) Meu sítio é muito bom,
______eu não moro lá por causa dos bandidos.
h) A mãe deu______ lapada no
menino do que na menina.
EXERCÍCIO 02
01 -
Preencher as lacunas corretamente utilizando:
"S"
ou "X"
a) au...iliar - e...tranho d) e...ato - e...cursão
b)
e...portâneo - e...tuprar e)
e...plícito - e...ame.
c)
e...tremo - mi...to,
02 -
Preencha as lacunas com: "Ç", "C", " SC", ou
"SS".
a)
sobre...alente - mi...anga
b)
ca...arola - flore...er
c) fal...ário - almo...o
d)
pa...oca - di...ente
e)
re...u...itar - có...ega
f)
bú...ola - carro...el
g)
pia...ava - pê...ego
03 -
Complete as palavras, preenchendo as lacunas com "J" ou "G".
b)
an...inho - a....eitar - ferru...em
c)
gor...eta, - pa...em - man...ericão
d)
laran...eira - re...eitar - berin ..ela, alei...e,
e)
man...edoura - ma...estoso - pa...é, la...e,
04 -
Complete as palavras, preenchendo as lacunas com "S" ou
"Z":
a)
adeu...inho - atra...ar, ameni...ar
b)
atravé... - pesqui...a - cateque...e
c)
reali...ar - xadre... - be...ouro,
d)
ba...ar - extrava...ar - pe...ar
e)
te....e - timide... - gi...
f)
lambu...ar - verni...- rodí...io
05 -
Preencha as lacuna com "X" ou "CH".
b)...u...u
- trou...a - ....a...im
c) fa...o
- bo...e...a - ...arope
d)
...ilindró - gra...a - ca...umba
e)
bro...e - ...ará - ...ácara
f)
...erife - ...ale - en...urrada
g)
fa...ina - en...erto - pu...ar
06 -
Complete as palavras, preenchendo as lacunas com "H", quando for necessário:
b)
...érnia, ...élice
c)
...ontem - ...ótica
d)
...olofote - ...emorragia
07 -
Preencha a lacuna com "E" ou "I".
b)
ent...ado - víd...o
c)
....nclinar - ....ncorporar
d)
pr...vilégio – pass.....ata
e)
test...munha – aér...o
f)
d...spesa – sentenc...ar
08 -
Complete as palavras, preenchendo as lacunas com "O" ou
"U":
a)
agríc...la – búss...la d)
m...chila – us...fruto
b)
lég....a – cúp...la e)
rég...a – vírg....la
c)
emb...tir – viníc...la
09 -
Complete com "L" ou "U" as palavras abaixo:
b) a
...ditivo - a ...tor - a ...tomático
c)
ca...ças - ca...tela - a...cançar
d) a
...tomóvel – inigualáve.....
10.
Complete as lacunas abaixo utilizando ISAR ou IZAR, conforme o necessário:
b)
canal_____
c)
hospital_____
d)
atual____
e)
human____
f)
anal____
g)
pesqu____
h)
catequ____
11. Use por que , por
quê ,
porque e porquê :
01. ............................ninguém ri agora?
02.
Eis................................. ninguém ri.
03.
Eis os princípios ..................luto.
04.
Ela não aprendeu, ...................?
05.
Aproximei-me ..................todos queriam me ouvir.
06.Você
está assustado, ..................?
07.
Eis o motivo.................errei.
08.
Creio que vou melhorar.........estudei muito.
09. O...............
é difícil de ser estudado.
10. ..........os
índios estão revoltados?
11. O
caminho ...............viemos era tortuoso.
12.
Ela não quer saber .............. eu faltei.
13.
Maria, ................. você está triste?
14.
Qual é o .................. de sua tristeza?
15. Eu
já falei dos problemas ........... passei?
16.
Maria vai estudar, ............ precisa.
17.
..............vocês estão com tanto sono?
18.
Vocês tem muito sono ............... ?
19. Ela
deve ter passado no Cotec, até ............ já está estudando lá.
20.
Não há ..................... se desesperar. A vida é boa.
21.
Você vai ter de me dar alguns ................ !
22.
Vocês vão passar ........... estudaram.
23.
Ela faltou, ............. choveu muito (visto que)
24.
Eu não vejo ......... correr. (motivo pelo qual).
12. Considere o texto:
-
Maria, .......................... você chorou ontem? Seria ....................
seu namorado sumiu, ou ...................... sua mãe ficou doente?
- Eu
não tenho .................................. responder!
-
............................... , Maria,
......................... ?
Cantigas - Trovadorismo.
TROVADORISMO
CANTIGA SUA PARTINDO-SE / João Ruiz de Castelo Branco,
"Cancioneiro Geral"
Senhora, partem tão tristes
meus olhos por vós, meu bem,
que nunca tão tristes vistes
outros nenhuns por ninguém.
Tão tristes, tão saudosos,
tão doentes da partida,
tão cansados, tão chorosos,
da morte mais desejosos
cem mil vezes que da vida.
Partem tão tristes os tristes,
tão fora d'esperar bem,
que nunca tão tristes vistes
outros nenhuns por ninguém.
meus olhos por vós, meu bem,
que nunca tão tristes vistes
outros nenhuns por ninguém.
Tão tristes, tão saudosos,
tão doentes da partida,
tão cansados, tão chorosos,
da morte mais desejosos
cem mil vezes que da vida.
Partem tão tristes os tristes,
tão fora d'esperar bem,
que nunca tão tristes vistes
outros nenhuns por ninguém.
QUESTÕES
1) No Trovadorismo, as cantigas de amor exprimiam um intenso sofrimento pela possibilidade da realização do amor, o homem idealizava a mulher, objeto de sua contemplação distante, a qual ele "prestava" o serviço amoroso. Quais as semelhanças e as diferenças entre a "Cantiga sua partindo-se" e as cantigas de amor?
2) Quais as semelhanças e as diferenças entre a "Cantiga sua partindo-se" e as cantigas de amigo?
3) O sentimento do homem ao partir é expresso pela repetição insistente de um adjetivo. Que adjetivo é esse?
4) Há um momento em que o autor torna o adjetivo mais expressivo, substantivando-o. Transcreva o verso em que isso ocorre:
1) No Trovadorismo, as cantigas de amor exprimiam um intenso sofrimento pela possibilidade da realização do amor, o homem idealizava a mulher, objeto de sua contemplação distante, a qual ele "prestava" o serviço amoroso. Quais as semelhanças e as diferenças entre a "Cantiga sua partindo-se" e as cantigas de amor?
2) Quais as semelhanças e as diferenças entre a "Cantiga sua partindo-se" e as cantigas de amigo?
3) O sentimento do homem ao partir é expresso pela repetição insistente de um adjetivo. Que adjetivo é esse?
4) Há um momento em que o autor torna o adjetivo mais expressivo, substantivando-o. Transcreva o verso em que isso ocorre:
LEMBRANÇA DE JOÃO ROIZ DE CASTEL'BRANCO
eles são que partem às terras que não sei,
onde memória de mim nunca passou,
onde é escondido meu nome de segredo.
Se de trevas se fazem as distâncias,
e com elas saudades e ausências,
Olhos cegos me fiquem, e não mais
que esperar do regresso a luz que foi.
José Saramago
QUESTÕES
1) O que há de semelhante e diferente
entre o texto lido e o texto "Cantiga sua partindo-se"?
2) O tema da partida ou da despedida é
recorrente na poesia portuguesa medieval. No século XV, ele se inclui no
contexto histórico e social da aventura marítima que deslocou tantos
portugueses para terras distantes. Como você interpreta o verso "eles são
que partem às terras que não sei..."?
3) Na "Cantiga sua
partindo-se", a expressão da tristeza culmina em uma hipérbole (exagero).
Qual é, no poema de Saramago, a expressão máxima do desespero do eu-lírico?
Artigo de Opinião
Artigo de
opinião
O artigo de opinião, como o próprio nome já diz, é
um texto em que o autor expõe seu posicionamento diante de algum tema atual e
de interesse de muitos.
É um texto dissertativo que apresenta argumentos
sobre o assunto abordado, portanto, o escritor além de expor seu ponto de
vista, deve sustentá-lo através de informações coerentes e admissíveis.
Logo, as ideias defendidas no artigo de opinião são
de total responsabilidade do autor, e, por este motivo, o mesmo deve ter
cuidado com a veracidade dos elementos apresentados, além de assinar o texto no
final.
Contudo, em vestibulares, a assinatura é
desnecessária, uma vez que pode identificar a autoria e desclassificar o
candidato.
É muito comum artigos de opinião em jornais e
revistas. Portanto, se você quiser aprofundar mais seus conhecimentos a
respeito desse tipo de produção textual, é só procurá-lo nestes tipos de canais
informativos. A leitura é breve e simples, pois são textos pequenos e a
linguagem não é intelectualizada, uma vez que a intenção é atingir todo tipo de
leitor.
Uma característica muito peculiar deste tipo de
gênero textual é a persuasão, que consiste na tentativa do emissor de convencer
o destinatário, neste caso, o leitor, a adotar a opinião apresentada. Por este
motivo, é comum presenciarmos descrições detalhadas, apelo emotivo, acusações,
humor satírico, ironia e fontes de informações precisas.
Como dito anteriormente, a linguagem é objetiva e
aparecem repletas de sinais de exclamação e interrogação, os quais incitam à
posição de reflexão favorável ao enfoque do autor.
Outros aspectos persuasivos são as orações no
imperativo (seja, compre, ajude, favoreça, exija, etc.) e a utilização de
conjunções que agem como elementos articuladores (e, mas, contudo, porém,
entretanto, uma vez que, de forma que, etc.) e dão maior clareza às ideias.
Geralmente, é escrito em primeira pessoa, já que
trata-se de um texto com marcas pessoais e, portanto, com indícios claros de
subjetividade, porém, pode surgir em terceira pessoa.
FUMANTE NÃO É EXCLUÍDO. É VÍTIMA.
Autora: Jussara
Fiterman
Muito me
surpreendeu o artigo publicado na edição de 14 de outubro, de autoria de um
estudante de Jornalismo que compara a legislação antifumo ao
nazismo, considerando-a um ataque à privacidade humana. Esta comparação
demonstra um completo desconhecimento do que foi o Holocausto e das
atrocidades infligidas pelos nazistas. Além disto, em poucas linhas o jovem
estudante vai contra pesquisadores, cientistas, médicos e cidadãos do
mundo inteiro que lutam incessantemente para evitar as mais de 5 milhões
de mortes ao ano relacionadas ao tabagismo. Número este que deve crescer para 8
milhões em 2030, de acordo com a Organização Mundial da Saúde.
Ao contrário do que afirma o artigo, os fumantes têm, sim, sua privacidade preservada. Lamentavelmente para eles, têm o direito de consumir o único produto legal que causa a morte da metade de seus usuários regulares. Para isso, só precisam respeitar o mesmo direito à privacidade dos não fumantes, não impondo a eles que respirem as mesmas substâncias que optam por inalar, e que em alguns casos saem da ponta do cigarro em concentrações ainda maiores.
A lei, no
entanto, vai além: busca proteger este indivíduo. Para se ter uma ideia,
na Itália, em 2005, um ano após o banimento do tabaco de locais públicos,
um estudo revelou que a frequência do tabagismo caiu 4% nos homens, as
vendas de cigarros diminuíram 5,5% e o número de infartos foi reduzido
em 11% nas pessoas com idade entre 35 e 64 anos.
Somente este
último dado, se transportado para a realidade no Brasil, equivaleria a 5
mil casos de infarto do miocárdio evitados em um ano. E se nenhum desses
dados pode convencer o jovem autor do artigo de que os malefícios do
cigarro não são apenas alegações, mas resultados de pesquisas, que tal
saber que 90% dos pacientes com câncer no pulmão são fumantes?
Por fim, às
vésperas do Dia do Médico,em 18 de outubro, gostaria de parabenizar os
quase 300 mil profissionais brasileiros destacando um estudo realizado em
2005, por importante instituto de pesquisa. "Confiança
nas Instituições" apresentou os médicos com um índice de 81% de confiabilidade pela
população, superando Igreja Católica (71%) e Forças Armadas (69%), além de
jornais, rádios,televisão, engenheiros, publicitários, advogados e tantos
outros igualmente importantes para o desenvolvimento da nação. Portanto,
antes de conferir aos médicos uma "habitual incapacidade de
curar doenças",como faz o caro estudante, aconselho-o a informar-se,
ler, pesquisar e atualizar-se.
Nossa posição
não é contra o fumante - para nós, uma vítima fisgada ainda na juventude
pela indústria do tabaco em suas ardilosas, agressivas e
enganosas propagandas -, mas contra o tabaco, pois também conhecemos
a fundo os danos que provocam nos pulmões de suas vítimas, muitas das
quais assistimos.
Ao suposto
direito individual "para fumar" que postulam algumas
organizações, há em contraposição um direito fundamental de "não
fumar", que apenas se manifesta no âmbito das liberdades reais quando
o Estado intervém no domínio econômico, para restringir o nocivo efeito da
publicidade e da influência da indústria sobre o indivíduo.
A saúde é
nosso bem mais precioso e, para nós, médicos, é também um objetivo de
vida, de luta e superação.
Artigo publicado no jornal "Zero Hora",
18/10/2009
CAVALEIROS
DA CANA VERSUS MECANIZAÇÃO
Mariane Cheli de Oliveira
Colégio Estadual Dr. Duílio Beltrão, Tamboara (PR)
Colégio Estadual Dr. Duílio Beltrão, Tamboara (PR)
O lugar onde vivo é uma típica cidadezinha do interior do Paraná, com uma população de apenas 4.275 habitantes. O formato do município de Tamboara é no mínimo curioso, quase um quadrado perfeito emoldurando uma cidade em miniatura com virtudes e problemas característicos de uma cidade pequena.
Em nosso município e região a cana-de-açúcar é a principal fonte de trabalho; é cortando cana que muitos trabalhadores sustentam suas famílias. Devido ao serviço árduo e estafante, podemos chamá-los de cavaleiros da cana, pois levantam de madrugada, vestem suas armaduras e saem para a luta com a determinação de guerreiros.
Mas
ultimamente algo vem lhes tirando o sono: a provável mecanização da colheita de
cana. Penso que isso não deveria acontecer, pois é indiscutível que esse tipo
de colheita irá ocasionar o desemprego de muitos trabalhadores braçais.
Com
a implantação da mecanização, as usinas teriam mais lucros, pois, segundo dados
da Alcopar, enquanto um trabalhador colhe em média seis toneladas de cana por
dia, uma máquina pode colher seiscentas.
Segundo dados da União dos Produtores de Bioenergia (UDOP), o Paraná ocupa o segundo lugar na produção de cana-de-açúcar. Isso é algo que podemos perceber claramente observando o aumento do plantio de cana em nossa área rural, que, se por um lado, gera muitos empregos, por outro, causa problemas ambientais.
Segundo dados da União dos Produtores de Bioenergia (UDOP), o Paraná ocupa o segundo lugar na produção de cana-de-açúcar. Isso é algo que podemos perceber claramente observando o aumento do plantio de cana em nossa área rural, que, se por um lado, gera muitos empregos, por outro, causa problemas ambientais.
Nesse
sentido, os que são contrários ao processo de mecanização da colheita de
cana-de-açúcar argumentam que ele tiraria o emprego de muita gente, que em sua
maioria possui baixa escolaridade e não conseguiria outro emprego,
principalmente com carteira assinada, como o proporcionado pelo corte de cana.
Os
que argumentam a favor citam as questões ambientais, pois com o trabalho das
máquinas não haveria a necessidade das queimadas dos canaviais que poluem o ar,
matam animais e prejudicam a saúde humana, principalmente a dos próprios
cortadores de cana que entram em contato direto com a fuligem.
Na minha opinião, os impactos negativos causados pelas queimadas são inegáveis, mas não deveriam servir de justificativa para a substituição de trabalhadores por máquinas. Vale lembrar que o corte da cana sem a prática da queimada não é impossível, pois isso já ocorre quando há o corte de cana para a produção de mudas.
Na minha opinião, os impactos negativos causados pelas queimadas são inegáveis, mas não deveriam servir de justificativa para a substituição de trabalhadores por máquinas. Vale lembrar que o corte da cana sem a prática da queimada não é impossível, pois isso já ocorre quando há o corte de cana para a produção de mudas.
Segundo
pesquisa feita pelo engenheiro ambiental Eleutério Languloski, não há motivos
que justifiquem técnica, ecológica ou socialmente as queimadas nos canaviais, a
não ser para maior rendimento da colheita.
Esse,
com certeza, é um impasse difícil de ser resolvido, mas acho que a solução está
com os donos de usinas, que poderiam abrir mão de suas margens de lucro,
acabando com a prática da queima de cana, pagando uma remuneração mais justa
aos seus trabalhadores que, produziriam menos do que na situação atual, e
fornecendo-lhes equipamentos de trabalho adequados para sua proteção, visto que
na colheita da cana os trabalhadores estariam mais sujeitos à picada de bichos
peçonhentos e cortes causados pelas folhas.
Assim,
o verde de nossos canaviais continuaria sendo a cor da esperança de nossos
cavaleiros, que vêem no plantio da cana e na força de seu trabalho a garantia
de sustento de suas famílias e o progresso de nossa cidade.
CELULAR EM SALA DE AULA: PROIBIR OU USAR COMO FERRAMENTA?
No final de maio, Pernambuco se tornou o mais
novo Estado brasileiro a proibir o uso de telefones celulares nas salas de
aula. A lei sancionada no estado nordestino vai ao encontro de normas
semelhantes adotadas no Rio de Janeiro, Goiás, São Paulo, entre outros. Também
em maio, uma pesquisa publicada pela London School of Economics and Political
Science (LSE) revelou que as escolas britânicas que baniram os celulares
registraram um aumento de 6% no desempenho de seus alunos. Segundo o estudo, os
aparelhos seriam uma causa de distração dos estudantes.
No entanto, professores e pesquisadores acreditam
que, em vez de proibir, as escolas deveriam usar os dispositivos móveis como
ferramenta pedagógica. É o caso do professor de física de Minas Gerais André
Parreira. Mestre em tecnologia educacional, ele trabalha na capacitação de
professores para o uso da tecnologia em sala de aula. “É preciso reconhecer o
celular como parte da vida do aluno, e não pode haver um abismo entre a vida e
a escola. A questão é ter um projeto pedagógico.”
Além da questão utilitária, o aparelho também pode
ser um fator de motivação dos estudantes, defende o psicopedagogo Eugênio
Cunha, professor da Faculdade Cenecista de Itaboraí e da Universidade Federal
Fluminense. Para ele, a questão é saber motivar a turma. “Posso até proibir o
celular, mas será que eu vou propor uma aula mais atraente? Acredito que disciplinar
seja mais eficiente do que proibir.” Segundo Cunha, o professor deve “ocupar” o
aparelho, propondo atividades e fazendo com que os estudantes saibam que, em
outros momentos, o aparelho precisará ser guardado.
Na mesma linha, o especialista em administração
escolar e orientação escolar Hamilton Werneck é contrário à proibição. Autor de
diversos livros sobre métodos de ensino, o pedagogo explica que a questão não
pode ser reduzida a liberar ou proibir radicalmente. O importante é ensinar aos
alunos os momentos de utilizar o instrumento e também a hora de parar.
Entre as vantagens do aparelho, Werneck salienta a
capacidade de pesquisa. “O professor pode pedir para a turma descobrir a
cotação do petróleo, por exemplo. Além da discussão específica, os estudantes
estão aprendendo a fazer pesquisa.”
Pais
ligavam na hora da aula
O professor Sérgio Ribeiro, diretor do Colégio
Motivo, de Pernambuco, acredita que o aparelho tira a atenção dos jovens.
Ribeiro entende que, mesmo voltada a fins pedagógicos, a utilização dos
celulares em aula seria convidativa para a dispersão. “A hiperatividade é muito
grande, e é difícil para o professor ter controle se os alunos estão
desenvolvendo a atividade proposta ou interagindo em redes sociais.” O
professor pondera que a tecnologia pode ser um acréscimo, mas não deve
substituir a aula tradicional.
Às vezes, os próprios pais e mães não seguem as
recomendações das escolas e costumam ligar para os filhos inclusive no horário
das aulas.
Antes mesmo da lei estadual, a escola pernambucana
já possuía regras rígidas quanto ao uso do telefone por parte dos alunos. Os
aparelhos não são proibidos, mas durante as aulas devem permanecer guardados e
no modo silencioso. Ribeiro salienta que é importante que os jovens aprendam,
na escola, a lidar com os dispositivos também em outros ambientes, como no
cinema ou em futuras reuniões profissionais.
O professor comenta ainda que a lei deu um respaldo
maior à postura do colégio e ajudou na conscientização, não apenas
dos alunos, mas também dos pais. Segundo ele, muitos pais
aproveitavam a facilidade do celular para fazer contato direto com seus filhos,
inclusive em horário de aula, mesmo com a escola tendo dado outra orientação,
disponibilizando números telefônicos da instituição para atender às famílias.
(noticias.terra.com.br)
Artigo
retirado do material "Olimpíadas de Língua Portuguesa"
CORRUPÇÃO CULTURAL OU ORGANIZADA? / Renato Janine
Ribeiro
Precisamos
evitar que a necessária indignação com as microcorrupções "culturais"
nos leve a ignorar a grande corrupção.
Ficamos muito
atentos, nos últimos anos, a um tipo de corrupção que é muito frequente em
nossa sociedade: o pequeno ato, que muitos praticam, de pedir um favor,
corromper um guarda ou, mesmo, violar a lei e o bem comum para obter uma
vantagem pessoal. Foi e é importante prestar atenção a essa responsabilidade
que temos, quase todos, pela corrupção política - por sinal, praticada por
gente eleita por nós.
Esclareço que,
por corrupção, não entendo sua definição legal, mas ética. Corrupção é o que
existe de mais antirrepublicano, isto é, mais contrário ao bem comum e à coisa
pública. Por isso, pertence à mesma família que trafegar pelo acostamento,
furar a fila, passar na frente dos outros. Às vezes é proibida por lei, outras,
não.
Mas, aqui, o que
conta é seu lado ético, não legal. Deputados brasileiros e britânicos fizeram
despesas legais, mas não éticas. É desse universo que trato. O problema é que a
corrupção "cultural", pequena, disseminada -que mencionei acima- não
é a única que existe. Aliás, sua existência nos poderes públicos tem sido
devassada por inúmeras iniciativas da sociedade, do Ministério Público, da
Controladoria Geral da União (órgão do Executivo) e do Tribunal de Contas da União
(que serve ao Legislativo).
Chamei-a de
"corrupção cultural" pois expressa uma cultura forte em nosso país,
que é a busca do privilégio pessoal somada a uma relação com o outro permeada
pelo favor. É, sim, antirrepublicana. Dissolve ou impede a criação de laços
importantes. Mas não faz sistema, não faz estrutura.
Porque há outra
corrupção que, essa, sim, organiza-se sob a forma de complô para pilhar os
cofres públicos -- e mal deixa rastros. A corrupção "cultural" é
visível para qualquer um. Suas pegadas são evidentes. Bastou colocar as contas
do governo na internet para saltarem aos olhos vários gastos indevidos, os
quais a mídia apontou no ano passado.
Mas nem a
tapioca de R$ 8 de um ministro nem o apartamento de um reitor -- gastos não
republicanos -- montam um complô. Não fazem parte de um sistema que vise a
desviar vultosas somas dos cofres públicos. Quem desvia essas grandes somas não
aparece, a não ser depois de investigações demoradas, que requerem talentos bem
aprimorados -da polícia, de auditores de crimes financeiros ou mesmo de
jornalistas muito especializados.
O problema é
que, ao darmos tanta atenção ao que é fácil de enxergar (a corrupção
"cultural"), acabamos esquecendo a enorme dimensão da corrupção
estrutural, estruturada ou, como eu a chamaria, organizada.
Ora, podemos ter certeza de uma coisa: um grande corrupto não usa cartão corporativo nem gasta dinheiro da Câmara com a faxineira. Para que vai se expor com migalhas? Ele ataca somas enormes. E só pode ser pego com dificuldade.
Ora, podemos ter certeza de uma coisa: um grande corrupto não usa cartão corporativo nem gasta dinheiro da Câmara com a faxineira. Para que vai se expor com migalhas? Ele ataca somas enormes. E só pode ser pego com dificuldade.
Se lembrarmos
que Al Capone acabou na cadeia por
ter fraudado o Imposto de Renda, crime bem menor do que as chacinas que
promoveu, é de imaginar que um megacorrupto tome cuidado com suas contas, com
os detalhes que possam levá-lo à cadeia -- e trate de esconder bem os caminhos
que levam a seus negócios.
Penso que
devemos combater os dois tipos de corrupção. A corrupção enquanto cultura nos
desmoraliza como povo. Ela nos torna "blasé". Faz-nos perder o
empenho em cultivar valores éticos. Porque a república é o regime por
excelência da ética na política: aquele que educa as pessoas para que prefiram
o bem geral à vantagem individual. Daí a importância dos exemplos, altamente
pedagógicos.
Valorizar o laço
social exige o fim da corrupção cultural, e isso só se consegue pela educação.
Temos de fazer que as novas gerações sintam pela corrupção a mesma ojeriza que
uma formação ética nos faz sentir pelo crime em geral.
Mas falar só na
corrupção cultural acaba nos indignando com o pequeno criminoso e poupando o
macrocorrupto. Mesmo uma sociedade como a norte-americana, em que corromper o
fiscal da prefeitura é bem mais raro, teve há pouco um governo cujo
vice-presidente favoreceu, antieticamente, uma empresa de suas relações na
ocupação do Iraque.
A corrupção
secreta e organizada não é privilégio de país pobre, "atrasado".
Porém, se pensarmos que corrupção mata -porque desvia dinheiro de hospitais, de
escolas, da segurança-, então a mais homicida é a corrupção estruturada.
Precisamos evitar que a necessária indignação com as microcorrupções "culturais" nos leve a ignorar a
grande corrupção. É mais difícil de descobrir. Mas é ela que mata mais gente.
Folha de S. Paulo. 28/6/2009 RENATO JANINE RIBEIRO, 59, é professor titular de ética e filosofia política do Departamento de Filosofia da USP. É autor, entre outras obras, de "República" (coleção Folha Explica, Publifolha).
Folha de S. Paulo. 28/6/2009 RENATO JANINE RIBEIRO, 59, é professor titular de ética e filosofia política do Departamento de Filosofia da USP. É autor, entre outras obras, de "República" (coleção Folha Explica, Publifolha).
ATIVIDADES / ARTIGO DE OPINIÃO
1.
Em
que veículo o texto foi publicado?
2.
O
veículo é bastante conhecido do público?
3.
Que
tipo de autor o escreveu?
4.
Além
do nome, há mais informações sobre ele?
5.
Qual
é o assunto principal abordado no texto?
6.
O
assunto abordado é atual ou ultrapassado em relação à data de publicação?
7.
Para
que tipo de leitor o artigo se dirige?
8.
Que
importância essas informações podem ter para esse leitor?
9.
Com
que finalidade esse assunto é abordado?
10. Considerando que
se trata de textos argumentativos, que ideia ou tese o autor parece defender?
11. Com que
argumentos?
A Cartomante, Machado de Assis.
A Cartomante, de Machado
de Assis
HAMLET observa a Horácio que há mais cousas no céu e na terra do que sonha a
nossa filosofia. Era a mesma explicação que dava a bela Rita ao moço Camilo,
numa sexta-feira de novembro de 1869, quando este ria dela, por ter ido na
véspera consultar uma cartomante; a diferença é que o fazia por outras
palavras.
— Ria, ria. Os homens são assim; não acreditam em nada. Pois saiba que fui, e que ela adivinhou o motivo da consulta, antes mesmo que eu lhe dissesse o que era. Apenas começou a botar as cartas, disse-me: "A senhora gosta de uma pessoa..." Confessei que sim, e então ela continuou a botar as cartas, combinou-as, e no fim declarou-me que eu tinha medo de que você me esquecesse, mas que não era verdade...
— Errou! interrompeu Camilo, rindo.
— Não diga isso, Camilo. Se você soubesse como eu tenho andado, por sua causa. Você sabe; já lhe disse. Não ria de mim, não ria...
Camilo pegou-lhe nas mãos, e olhou para ela sério e fixo. Jurou que lhe queria muito, que os seus sustos pareciam de criança; em todo o caso, quando tivesse algum receio, a melhor cartomante era ele mesmo. Depois, repreendeu-a; disse-lhe que era imprudente andar por essas casas. Vilela podia sabê-lo, e depois...
— Qual saber! Tive muita cautela, ao entrar na casa.
— Onde é a casa?
— Aqui perto, na Rua da Guarda Velha; não passava ninguém nessa ocasião. Descansa; eu não sou maluca.
Camilo riu outra vez:
— Tu crês deveras nessas cousas? perguntou-lhe.
Foi então que ela, sem saber que traduzia Hamlet em vulgar, disse-lhe que havia muita cousa misteriosa e verdadeira neste mundo. Se ele não acreditava, paciência; mas o certo é que a cartomante adivinhara tudo. Que mais? A prova é que ela agora estava tranquila e satisfeita.
Cuido que ele ia falar, mas reprimiu-se. Não queria arrancar-lhe as ilusões. Também ele, em criança, e ainda depois, foi supersticioso, teve um arsenal inteiro de crendices, que a mãe lhe incutiu e que aos vinte anos desapareceram. No dia em que deixou cair toda essa vegetação parasita, e ficou só o tronco da religião, ele, como tivesse recebido da mãe ambos os ensinos, envolveu-os na mesma dúvida, e logo depois em uma só negação total. Camilo não acreditava em nada. Por quê? Não poderia dizê-lo, não possuía um só argumento: limitava-se a negar tudo. E digo mal, porque negar é ainda afirmar, e ele não formulava a incredulidade; diante do mistério, contentou-se em levantar os ombros, e foi andando.
Separaram-se contentes, ele ainda mais que ela. Rita estava certa de ser amada; Camilo, não só o estava, mas via-a estremecer e arriscar-se por ele, correr às cartomantes, e, por mais que a repreendesse, não podia deixar de sentir-se lisonjeado. A casa do encontro era na antiga Rua dos Barbonos, onde morava uma comprovinciana de Rita. Esta desceu pela Rua das Mangueiras, na direção de Botafogo, onde resi dia ; Camilo desceu pela da Guarda Velha, olhan do de passagem para a casa da cartomante.
Vilela, Camilo e R ita, três nomes, uma aventura e nenhuma explicação das o rigens. Vamos a ela. Os dois primeiros eram amigos de infância. Vilela seguiu a carreira de magistrado. Camilo entrou no funcionalismo, contra a vontade do pai, que queria vê-lo médico; mas o pai morreu, e Camilo preferiu não ser nada, até que a mãe lhe arranjou um emprego público. No princípio de 1869, voltou Vilela da província, onde casara com uma dama formosa e tonta; abandonou a magistratura e veio abrir banca de advogado. Camilo arranjou-lhe casa para os lados de Botafogo, e foi a bordo recebê-lo.
— É o senhor? exclamou Rita, estendendo-lhe a mão. Não imagina como meu marido é seu amigo, falava sempre do senhor.
Camilo e Vilela olharam-se com ternura. Eram amigos deveras.
Depois, Camilo confessou de si para si que a mulher do Vilela não desmentia as cartas do marido. Realmente, era graciosa e viva nos gestos, olhos cálidos, boca fina e interrogativa. Era um pouco mais velha que ambos: contava trinta anos, Vilela vinte e nove e Camilo vinte e seis. Entretanto, o porte grave de Vilela fazia-o parecer mais velho que a mulher, enquanto Camilo era um ingênuo na vida moral e prática. Faltava-lhe tanto a ação do tempo, como os óculos de cristal, que a natureza põe no berço de alguns para adiantar os anos. Nem experiência, nem intuição.
Uniram-se os três. Convivência trouxe intimidade. Pouco depois morreu a mãe de Camilo, e nesse desastre, que o foi, os dois mostraram-se grandes amigos dele. Vilela cuidou do enterro, dos sufrágios e do inventário; Rita tratou especialmente do coração, e ninguém o faria melhor.
Como daí chegaram ao amor, não o soube ele nunca. A verdade é que gostava de passar as horas ao lado dela, era a sua enfermeira moral, quase uma irmã, mas principalmente era mulher e bonita. Odor di femmina: eis o que ele aspirava nela, e em volta dela, para incorporá-lo em si próprio. Liam os mesmos livros, iam juntos a teatros e passeios. Camilo ensinou-lhe as damas e o xadrez e jogavam às noites; — ela mal, — ele, para lhe ser agradável, pouco menos mal. Até aí as cousas. Agora a ação da pessoa, os olhos teimosos de Rita, que procuravam muita vez os dele, que os consultavam antes de o fazer ao marido, as mãos frias, as atitudes insólitas. Um dia, fazendo ele anos, recebeu de Vilela uma rica bengala de presente e de Rita apenas um cartão com um vulgar cumprimento a lápis, e foi então que ele pôde ler no próprio coração, não conseguia arrancar os olhos do bilhetinho. Palavras vulgares; mas há vulgaridades sublimes, ou, pelo menos, deleitosas. A velha caleça de praça, em que pela primeira vez passeaste com a mulher amada, fechadinhos ambos, vale o carro de Apolo. Assim é o homem, assim são as cousas que o cercam.
Camilo quis sinceramente fugir, mas já não pôde. Rita, como uma serpente, foi-se acercando dele, envolveu-o todo, fez-lhe estalar os ossos num espasmo, e pingou-lhe o veneno na boca. Ele ficou atordoado e subjugado. Vexame, sustos, remorsos, desejos, tudo sentiu de mistura, mas a batalha foi curta e a vitória delirante. Adeus, escrúpulos! Não tardou que o sapato se acomodasse ao pé, e aí foram ambos, estrada fora, braços dados, pisando folgadamente por cima de ervas e pedregulhos, sem padecer nada mais que algumas saudades, quando estavam ausentes um do outro. A confiança e estima de Vilela continuavam a ser as mesmas.
Um dia, porém, recebeu Camilo uma carta anônima, que lhe chamava imoral e pérfido, e dizia que a aventura era sabida de todos. Camilo teve medo, e, para desviar as suspeitas, começou a rarear as visitas à casa de Vilela. Este notou-lhe as ausências. Camilo respondeu que o motivo era uma paixão frívola de rapaz. Candura gerou astúcia. As ausências prolongaram-se, e as visitas cessaram inteiramente. Pode ser que entrasse também nisso um pouco de amor-próprio, uma intenção de diminuir os obséq ui os do marido, para tornar menos dura a aleivo sia do ato.
Foi por e sse tempo que Rita, desconfiada e medros a, correu à cartomante para consultá-la sobre a verdadeir a causa do procedimento de Camilo. Vimos que a cartomante restituiu-lhe a confiança, e que o rapaz repreendeu-a por ter feito o que fez. Correram ainda algumas semanas. Camilo recebeu mais duas ou três cartas anônimas, tão apaixonadas, que não podiam ser advertência da virtude, mas despeito de algum pretendente; tal foi a opinião de Rita, que, por outras palavras mal compostas, formulou este pensamento: — a virtude é preguiçosa e avara, não gasta tempo nem papel; só o interesse é ativo e pródigo.
Nem por isso Camilo ficou mais sossegado; temia que o anônimo fosse ter com Vilela, e a catástrofe viria então sem remédio. Rita concordou que era possível.
— Bem, disse ela; eu levo os sobrescritos para comparar a letra com as das cartas que lá aparecerem; se alguma for igual, guardo-a e rasgo-a...
Nenhuma apareceu; mas daí a algum tempo Vilela começou a mostrar-se sombrio, falando pouco, como desconfiado. Rita deu-se pressa em dizê-lo ao outro, e sobre isso deliberaram. A opinião dela é que Camilo devia tornar à casa deles, tatear o marido, e pode ser até que lhe ouvisse a confidência de algum negócio particular. Camilo divergia; aparecer depois de tantos meses era confirmar a suspeita ou denúncia. Mais valia acautelarem-se, sacrificando-se por algumas semanas. Combinaram os meios de se corresponderem , em caso de necessidade, e separaram-se com lágrimas.
No dia seguinte, estando na repartição, recebeu Camilo este bilhete de Vilela: "Vem já, já, à nossa casa; preciso falar-te sem demora." Era mais de meio-dia. Camilo saiu logo; na rua, advertiu que teria sido mais natural chamá-lo ao escritório; por que em casa? Tudo indicava materia especial, e a letra, fosse realidade ou ilusão, afigurou-se-lhe trêmula. Ele combinou todas essas cousas com a notícia da véspera.
— Vem já, já, à nossa casa; preciso falar-te sem demora, — repetia ele com os olhos no papel.
Imaginariamente, viu a ponta da orelha de um drama, Rita subjugada e lacrimosa, Vilela indignado, pegando da pena e escrevendo o bilhete, certo de que ele acudiria, e esperando-o para matá-lo. Camilo estremeceu, tinha medo: depois sorriu amarelo, e em todo caso repugnava-lhe a idéia de recuar, e foi andando. De caminho, lembrou-se de ir a casa; podia achar algum recado de Rita, que lhe explicasse tudo. Não achou nada, nem ninguém. Voltou à rua, e a idéia de estarem descobertos parecia-lhe cada vez mais verossímil; era natural uma denúncia anônima, até da própria pessoa que o ameaçara antes; podia ser que Vilela conhecesse agora tudo. A mesma suspensão das suas visitas, sem motivo aparente, apenas com um pretexto fútil, viria confirmar o resto.
Camilo ia andando inquieto e nervoso. Não relia o bilhete, mas as palavras estavam decoradas, diante dos olhos, fixas, ou então, — o que era ainda pior, — eram-lhe murmuradas ao ouvido, com a própria voz de Vilela. "Vem já, já, à nossa casa; preciso falar-te sem demora." Ditas assim, pela voz do outro, tinham um tom de mistério e ameaça. Vem, já, já, para quê? Era perto de uma hora da tarde. A comoção crescia de minuto a minuto. Tanto imaginou o que se iria passar, que chegou a crê-lo e vê-lo. Positivamente, tinha medo. Entrou a cogitar em ir armado, considerando que, se nada houvesse, nada perdia, e a precaução era útil. Logo depois rejeitava a idéia, vexado de si mesmo, e seguia, picando o passo, na direção do Largo da Carioca, para entrar num tílburi. Chegou, entrou e mandou seguir a trote largo.
"Quanto antes, melhor, pensou ele; não posso estar assim..."
Mas o mesmo trote do cavalo veio agravar-lhe a comoção. O tempo voava, e ele não tardaria a entestar com o perigo. Quase no fim da Rua da Guarda Velha, o tílburi teve de parar, a rua estava atravancada com uma carroça, que caíra. Camilo, em si mesmo, estimou o obs t áculo, e esperou. No fim de cinco minutos, repa rou que ao lado, à esquerda, ao pé do tílburi, ficava a casa da carto mante, a quem Rita consultara uma vez, e nunca ele desejou tanto crer na lição das cartas. Olhou, viu as janelas fechadas, quando todas as outras estavam abertas e pejadas de curiosos do incidente da rua. Dir-se-ia a morada do indiferente Destino.
Camilo reclinou-se no tílburi, para não ver nada. A agitação dele era grande, extraordinária, e do fundo das camadas morais emergiam alguns fantasmas de outro tempo, as velhas crenças, as superstições antigas. O cocheiro propôs-lhe voltar à primeira travessa, e ir por outro caminho: ele respondeu que não, que esperasse. E inclinava-se para fitar a casa... Depois fez um gesto incrédulo: era a idéia de ouvir a cartomante, que lhe passava ao longe, muito longe, com vastas asas cinzentas; desapareceu, reapareceu, e tornou a esvair-se no cérebro; mas daí a pouco moveu outra vez as asas, mais perto, fazendo uns giros concêntricos... Na rua, gritavam os homens, safando a carroça:
— Anda! agora! empurra! vá! vá!
Daí a pouco estaria removido o obstáculo. Camilo fechava os olhos, pensava em outras cousas: mas a voz do marido sussurrava-lhe a orelhas as palavras da carta: "Vem, já, já..." E ele via as contorções do drama e tremia. A casa olhava para ele. As pernas queriam descer e entrar . Camilo achou-se diante de um longo véu opaco... pensou rapidamente no inexplicável de tantas cousas. A voz da mãe repetia-lhe uma porção de casos extraordinários: e a mesma frase do príncipe de Dinamarca reboava-lhe dentro: "Há mais cousas no céu e na terra do que sonha a filosofia... " Que perdia ele, se... ?
Deu por si na calçada, ao pé da porta: disse ao cocheiro que esperasse, e rápido enfiou pelo corredor, e subiu a escada. A luz era pouca, os degraus comidos dos pés, o corrimão pegajoso; mas ele não viu nem sentiu nada. Trepou e bateu. Não aparecendo ninguém, teve idéia de descer; mas era tarde, a curiosidade fustigava-lhe o sangue, as fontes latejavam-lhe; ele tornou a bater uma, duas, três pancadas. Veio uma mulher; era a cartomante. Camilo disse que ia cônsultá-la, ela fê-lo entrar. Dali subiram ao sótão, por uma escada ainda pior que a primeira e mais escura. Em cima, havia uma salinha, mal alumiada por uma janela, que dava para o telhado dos fundos. Velhos trastes, paredes sombrias, um ar de pobreza, que antes aumentava do que destruía o prestígio.
A cartomante fê-lo sentar diante da mesa, e sentou-se do lado oposto, com as costas para a janela, de maneira que a pouca luz de fora batia em cheio no rosto de Camilo. Abriu uma gaveta e tirou um baralho de cartas compridas e enxovalhadas. Enquanto as baralhava, rapidamente, olhava para ele, não de rosto, mas por baixo dos olhos. Era uma mulher de quarenta anos, italiana, morena e magra, com grandes olhos sonsos e agudos. Voltou três cartas sobre a mesa, e disse-lhe:
— Vejamos primeiro o que é que o traz aqui. O senhor tem um grande susto...
Camilo, maravilhado, fez um gesto afirmativo.
— E quer saber, continuou ela, se lhe acontecerá alguma cousa ou não...
— A mim e a ela, explicou vivamente ele.
A cartomante não sorriu: disse-lhe só que esperasse. Rápido pegou outra vez das cartas e baralhou-as, com os longos dedos finos, de unhas descuradas; baralhou-as bem, transpôs os maços, uma, duas. três vezes; depois começou a estendê-las. Camilo tinha os olhos nela. curioso e ansioso.
— As cartas dizem-me...
Camilo inclinou-se para beber uma a uma as palavras. Então ela declarou-lhe que não tivesse medo de nada. Nada aconteceria nem a um nem a outro; ele, o terceiro, ignorava tudo. Não obstante, era indispensável muita cautela: ferviam invejas e despeitos. Falou-lhe do amor que os ligava, da beleza de Rita. . . Camilo estava deslumbrado. A cartomante acabou, recolheu as cartas e fechou-as na gaveta.
— A senhora restituiu-me a paz ao espírito, disse ele estendendo a m ão por cima da mesa apertando a da cartomante. Esta levantou-se, rindo.
— Vá, disse ela; vá, ragazzo innamo rato...
E de pé, com o dedo indicador, tocou-lhe na testa. Camilo estremeceu, como se fosse a mão da própria sibila, e levantou-se também. A cartomante foi à cômoda, sobre a qual estava um prato com passas, tirou um cacho destas, começou a despencá-las e comê-las, mostrando duas fileiras de dentes que desmentiam as unhas. Nessa mesma ação comum, a mulher tinha um ar particular. Camilo, ansioso por sair, não sabia como pagasse; ignorava o preço.
— Passas custam dinheiro, disse ele afinal, tirando a carteira. Quantas quer mandar buscar?
— Pergunte ao seu coração, respondeu ela.
Camilo tirou uma nota de dez mil-réis, e deu-lha. Os olhos da cartomante fuzilaram. O preço usual era dois mil-réis.
— Vejo bem que o senhor gosta muito dela... E faz bem; ela gosta muito do senhor. Vá, vá, tranquilo. Olhe a escada, é escura; ponha o chapéu...
A cartomante tinha já guardado a nota na algibeira, e descia com ele, falando, com um leve sotaque. Camilo despediu-se dela embaixo, e desceu a escada que levava à rua, enquanto a cartomante, alegre com a paga, tornava acima, cantarolando uma barcarola. Camilo achou o tílburi esperando; a rua estava livre. Entrou e seguiu a trote largo.
Tudo lhe parecia agora melhor, as outras cousas traziam outro aspecto, o céu estava límpido e as caras joviais. Chegou a rir dos seus receios, que chamou pueris; recordou os termos da carta de Vilela e reconheceu que eram íntimos e familiares. Onde é que ele lhe descobrira a ameaça? Advertiu também que eram urgentes, e que fizera mal em demorar-se tanto; podia ser algum negócio grave e gravíssimo.
— Vamos, vamos depressa, repetia ele ao cocheiro.
E consigo, para explicar a demora ao amigo, engenhou qualquer cousa; parece que formou também o plano de aproveitar o incidente para tornar à antiga assiduidade... De volta com os planos, reboavam-lhe na alma as palavras da cartomante. Em verdade, ela adivinhara o objeto da consulta, o estado dele, a existência de um terceiro; por que não adivinharia o resto? O presente que se ignora vale o futuro. Era assim, lentas e contínuas, que as velhas crenças do rapaz iam tornando ao de cima, e o mistério empolgava-o com as unhas de ferro. Às vezes queria rir, e ria de si mesmo, algo vexado; mas a mulher, as cartas, as palavras secas e afirmativas, a exor-tação: — Vá, vá, ragazzo innamorato; e no fim, ao longe, a barcarola da despedida, lenta e graciosa, tais eram os elementos recentes, que formavam, com os antigos, uma fé nova e vivaz.
A verdade é que o coração ia alegre e impaciente, pensando nas horas felizes de outrora e nas que haviam de vir. Ao passar pela Glória, Camilo olhou para o mar, estendeu os olhos para fora, até onde a água e o céu dão um abraço infinito, e teve assim uma sensação do futuro, longo, longo, interminável.
Daí a pouco chegou à casa de Vilela. Apeou-se, empurrou a porta de ferro do jardim e entrou. A casa estava silenciosa. Subiu os seis degraus de pedra, e mal teve tempo de bater, a porta abriu-se, e apareceu-lhe Vilela.
— Desculpa, não pude vir mais cedo; que há?
Vilela não lhe respondeu; tinha as feições decompostas; fez-lhe sinal, e foram para uma saleta interior. Entrando, Camilo não pôde sufocar um grito de terror: — ao fundo sobre o canapé, estava Rita morta e ensanguentada. Vilela pegou-o pela gola, e, com dois tiros de revólver, estirou-o morto no chão.
— Ria, ria. Os homens são assim; não acreditam em nada. Pois saiba que fui, e que ela adivinhou o motivo da consulta, antes mesmo que eu lhe dissesse o que era. Apenas começou a botar as cartas, disse-me: "A senhora gosta de uma pessoa..." Confessei que sim, e então ela continuou a botar as cartas, combinou-as, e no fim declarou-me que eu tinha medo de que você me esquecesse, mas que não era verdade...
— Errou! interrompeu Camilo, rindo.
— Não diga isso, Camilo. Se você soubesse como eu tenho andado, por sua causa. Você sabe; já lhe disse. Não ria de mim, não ria...
Camilo pegou-lhe nas mãos, e olhou para ela sério e fixo. Jurou que lhe queria muito, que os seus sustos pareciam de criança; em todo o caso, quando tivesse algum receio, a melhor cartomante era ele mesmo. Depois, repreendeu-a; disse-lhe que era imprudente andar por essas casas. Vilela podia sabê-lo, e depois...
— Qual saber! Tive muita cautela, ao entrar na casa.
— Onde é a casa?
— Aqui perto, na Rua da Guarda Velha; não passava ninguém nessa ocasião. Descansa; eu não sou maluca.
Camilo riu outra vez:
— Tu crês deveras nessas cousas? perguntou-lhe.
Foi então que ela, sem saber que traduzia Hamlet em vulgar, disse-lhe que havia muita cousa misteriosa e verdadeira neste mundo. Se ele não acreditava, paciência; mas o certo é que a cartomante adivinhara tudo. Que mais? A prova é que ela agora estava tranquila e satisfeita.
Cuido que ele ia falar, mas reprimiu-se. Não queria arrancar-lhe as ilusões. Também ele, em criança, e ainda depois, foi supersticioso, teve um arsenal inteiro de crendices, que a mãe lhe incutiu e que aos vinte anos desapareceram. No dia em que deixou cair toda essa vegetação parasita, e ficou só o tronco da religião, ele, como tivesse recebido da mãe ambos os ensinos, envolveu-os na mesma dúvida, e logo depois em uma só negação total. Camilo não acreditava em nada. Por quê? Não poderia dizê-lo, não possuía um só argumento: limitava-se a negar tudo. E digo mal, porque negar é ainda afirmar, e ele não formulava a incredulidade; diante do mistério, contentou-se em levantar os ombros, e foi andando.
Separaram-se contentes, ele ainda mais que ela. Rita estava certa de ser amada; Camilo, não só o estava, mas via-a estremecer e arriscar-se por ele, correr às cartomantes, e, por mais que a repreendesse, não podia deixar de sentir-se lisonjeado. A casa do encontro era na antiga Rua dos Barbonos, onde morava uma comprovinciana de Rita. Esta desceu pela Rua das Mangueiras, na direção de Botafogo, onde resi dia ; Camilo desceu pela da Guarda Velha, olhan do de passagem para a casa da cartomante.
Vilela, Camilo e R ita, três nomes, uma aventura e nenhuma explicação das o rigens. Vamos a ela. Os dois primeiros eram amigos de infância. Vilela seguiu a carreira de magistrado. Camilo entrou no funcionalismo, contra a vontade do pai, que queria vê-lo médico; mas o pai morreu, e Camilo preferiu não ser nada, até que a mãe lhe arranjou um emprego público. No princípio de 1869, voltou Vilela da província, onde casara com uma dama formosa e tonta; abandonou a magistratura e veio abrir banca de advogado. Camilo arranjou-lhe casa para os lados de Botafogo, e foi a bordo recebê-lo.
— É o senhor? exclamou Rita, estendendo-lhe a mão. Não imagina como meu marido é seu amigo, falava sempre do senhor.
Camilo e Vilela olharam-se com ternura. Eram amigos deveras.
Depois, Camilo confessou de si para si que a mulher do Vilela não desmentia as cartas do marido. Realmente, era graciosa e viva nos gestos, olhos cálidos, boca fina e interrogativa. Era um pouco mais velha que ambos: contava trinta anos, Vilela vinte e nove e Camilo vinte e seis. Entretanto, o porte grave de Vilela fazia-o parecer mais velho que a mulher, enquanto Camilo era um ingênuo na vida moral e prática. Faltava-lhe tanto a ação do tempo, como os óculos de cristal, que a natureza põe no berço de alguns para adiantar os anos. Nem experiência, nem intuição.
Uniram-se os três. Convivência trouxe intimidade. Pouco depois morreu a mãe de Camilo, e nesse desastre, que o foi, os dois mostraram-se grandes amigos dele. Vilela cuidou do enterro, dos sufrágios e do inventário; Rita tratou especialmente do coração, e ninguém o faria melhor.
Como daí chegaram ao amor, não o soube ele nunca. A verdade é que gostava de passar as horas ao lado dela, era a sua enfermeira moral, quase uma irmã, mas principalmente era mulher e bonita. Odor di femmina: eis o que ele aspirava nela, e em volta dela, para incorporá-lo em si próprio. Liam os mesmos livros, iam juntos a teatros e passeios. Camilo ensinou-lhe as damas e o xadrez e jogavam às noites; — ela mal, — ele, para lhe ser agradável, pouco menos mal. Até aí as cousas. Agora a ação da pessoa, os olhos teimosos de Rita, que procuravam muita vez os dele, que os consultavam antes de o fazer ao marido, as mãos frias, as atitudes insólitas. Um dia, fazendo ele anos, recebeu de Vilela uma rica bengala de presente e de Rita apenas um cartão com um vulgar cumprimento a lápis, e foi então que ele pôde ler no próprio coração, não conseguia arrancar os olhos do bilhetinho. Palavras vulgares; mas há vulgaridades sublimes, ou, pelo menos, deleitosas. A velha caleça de praça, em que pela primeira vez passeaste com a mulher amada, fechadinhos ambos, vale o carro de Apolo. Assim é o homem, assim são as cousas que o cercam.
Camilo quis sinceramente fugir, mas já não pôde. Rita, como uma serpente, foi-se acercando dele, envolveu-o todo, fez-lhe estalar os ossos num espasmo, e pingou-lhe o veneno na boca. Ele ficou atordoado e subjugado. Vexame, sustos, remorsos, desejos, tudo sentiu de mistura, mas a batalha foi curta e a vitória delirante. Adeus, escrúpulos! Não tardou que o sapato se acomodasse ao pé, e aí foram ambos, estrada fora, braços dados, pisando folgadamente por cima de ervas e pedregulhos, sem padecer nada mais que algumas saudades, quando estavam ausentes um do outro. A confiança e estima de Vilela continuavam a ser as mesmas.
Um dia, porém, recebeu Camilo uma carta anônima, que lhe chamava imoral e pérfido, e dizia que a aventura era sabida de todos. Camilo teve medo, e, para desviar as suspeitas, começou a rarear as visitas à casa de Vilela. Este notou-lhe as ausências. Camilo respondeu que o motivo era uma paixão frívola de rapaz. Candura gerou astúcia. As ausências prolongaram-se, e as visitas cessaram inteiramente. Pode ser que entrasse também nisso um pouco de amor-próprio, uma intenção de diminuir os obséq ui os do marido, para tornar menos dura a aleivo sia do ato.
Foi por e sse tempo que Rita, desconfiada e medros a, correu à cartomante para consultá-la sobre a verdadeir a causa do procedimento de Camilo. Vimos que a cartomante restituiu-lhe a confiança, e que o rapaz repreendeu-a por ter feito o que fez. Correram ainda algumas semanas. Camilo recebeu mais duas ou três cartas anônimas, tão apaixonadas, que não podiam ser advertência da virtude, mas despeito de algum pretendente; tal foi a opinião de Rita, que, por outras palavras mal compostas, formulou este pensamento: — a virtude é preguiçosa e avara, não gasta tempo nem papel; só o interesse é ativo e pródigo.
Nem por isso Camilo ficou mais sossegado; temia que o anônimo fosse ter com Vilela, e a catástrofe viria então sem remédio. Rita concordou que era possível.
— Bem, disse ela; eu levo os sobrescritos para comparar a letra com as das cartas que lá aparecerem; se alguma for igual, guardo-a e rasgo-a...
Nenhuma apareceu; mas daí a algum tempo Vilela começou a mostrar-se sombrio, falando pouco, como desconfiado. Rita deu-se pressa em dizê-lo ao outro, e sobre isso deliberaram. A opinião dela é que Camilo devia tornar à casa deles, tatear o marido, e pode ser até que lhe ouvisse a confidência de algum negócio particular. Camilo divergia; aparecer depois de tantos meses era confirmar a suspeita ou denúncia. Mais valia acautelarem-se, sacrificando-se por algumas semanas. Combinaram os meios de se corresponderem , em caso de necessidade, e separaram-se com lágrimas.
No dia seguinte, estando na repartição, recebeu Camilo este bilhete de Vilela: "Vem já, já, à nossa casa; preciso falar-te sem demora." Era mais de meio-dia. Camilo saiu logo; na rua, advertiu que teria sido mais natural chamá-lo ao escritório; por que em casa? Tudo indicava materia especial, e a letra, fosse realidade ou ilusão, afigurou-se-lhe trêmula. Ele combinou todas essas cousas com a notícia da véspera.
— Vem já, já, à nossa casa; preciso falar-te sem demora, — repetia ele com os olhos no papel.
Imaginariamente, viu a ponta da orelha de um drama, Rita subjugada e lacrimosa, Vilela indignado, pegando da pena e escrevendo o bilhete, certo de que ele acudiria, e esperando-o para matá-lo. Camilo estremeceu, tinha medo: depois sorriu amarelo, e em todo caso repugnava-lhe a idéia de recuar, e foi andando. De caminho, lembrou-se de ir a casa; podia achar algum recado de Rita, que lhe explicasse tudo. Não achou nada, nem ninguém. Voltou à rua, e a idéia de estarem descobertos parecia-lhe cada vez mais verossímil; era natural uma denúncia anônima, até da própria pessoa que o ameaçara antes; podia ser que Vilela conhecesse agora tudo. A mesma suspensão das suas visitas, sem motivo aparente, apenas com um pretexto fútil, viria confirmar o resto.
Camilo ia andando inquieto e nervoso. Não relia o bilhete, mas as palavras estavam decoradas, diante dos olhos, fixas, ou então, — o que era ainda pior, — eram-lhe murmuradas ao ouvido, com a própria voz de Vilela. "Vem já, já, à nossa casa; preciso falar-te sem demora." Ditas assim, pela voz do outro, tinham um tom de mistério e ameaça. Vem, já, já, para quê? Era perto de uma hora da tarde. A comoção crescia de minuto a minuto. Tanto imaginou o que se iria passar, que chegou a crê-lo e vê-lo. Positivamente, tinha medo. Entrou a cogitar em ir armado, considerando que, se nada houvesse, nada perdia, e a precaução era útil. Logo depois rejeitava a idéia, vexado de si mesmo, e seguia, picando o passo, na direção do Largo da Carioca, para entrar num tílburi. Chegou, entrou e mandou seguir a trote largo.
"Quanto antes, melhor, pensou ele; não posso estar assim..."
Mas o mesmo trote do cavalo veio agravar-lhe a comoção. O tempo voava, e ele não tardaria a entestar com o perigo. Quase no fim da Rua da Guarda Velha, o tílburi teve de parar, a rua estava atravancada com uma carroça, que caíra. Camilo, em si mesmo, estimou o obs t áculo, e esperou. No fim de cinco minutos, repa rou que ao lado, à esquerda, ao pé do tílburi, ficava a casa da carto mante, a quem Rita consultara uma vez, e nunca ele desejou tanto crer na lição das cartas. Olhou, viu as janelas fechadas, quando todas as outras estavam abertas e pejadas de curiosos do incidente da rua. Dir-se-ia a morada do indiferente Destino.
Camilo reclinou-se no tílburi, para não ver nada. A agitação dele era grande, extraordinária, e do fundo das camadas morais emergiam alguns fantasmas de outro tempo, as velhas crenças, as superstições antigas. O cocheiro propôs-lhe voltar à primeira travessa, e ir por outro caminho: ele respondeu que não, que esperasse. E inclinava-se para fitar a casa... Depois fez um gesto incrédulo: era a idéia de ouvir a cartomante, que lhe passava ao longe, muito longe, com vastas asas cinzentas; desapareceu, reapareceu, e tornou a esvair-se no cérebro; mas daí a pouco moveu outra vez as asas, mais perto, fazendo uns giros concêntricos... Na rua, gritavam os homens, safando a carroça:
— Anda! agora! empurra! vá! vá!
Daí a pouco estaria removido o obstáculo. Camilo fechava os olhos, pensava em outras cousas: mas a voz do marido sussurrava-lhe a orelhas as palavras da carta: "Vem, já, já..." E ele via as contorções do drama e tremia. A casa olhava para ele. As pernas queriam descer e entrar . Camilo achou-se diante de um longo véu opaco... pensou rapidamente no inexplicável de tantas cousas. A voz da mãe repetia-lhe uma porção de casos extraordinários: e a mesma frase do príncipe de Dinamarca reboava-lhe dentro: "Há mais cousas no céu e na terra do que sonha a filosofia... " Que perdia ele, se... ?
Deu por si na calçada, ao pé da porta: disse ao cocheiro que esperasse, e rápido enfiou pelo corredor, e subiu a escada. A luz era pouca, os degraus comidos dos pés, o corrimão pegajoso; mas ele não viu nem sentiu nada. Trepou e bateu. Não aparecendo ninguém, teve idéia de descer; mas era tarde, a curiosidade fustigava-lhe o sangue, as fontes latejavam-lhe; ele tornou a bater uma, duas, três pancadas. Veio uma mulher; era a cartomante. Camilo disse que ia cônsultá-la, ela fê-lo entrar. Dali subiram ao sótão, por uma escada ainda pior que a primeira e mais escura. Em cima, havia uma salinha, mal alumiada por uma janela, que dava para o telhado dos fundos. Velhos trastes, paredes sombrias, um ar de pobreza, que antes aumentava do que destruía o prestígio.
A cartomante fê-lo sentar diante da mesa, e sentou-se do lado oposto, com as costas para a janela, de maneira que a pouca luz de fora batia em cheio no rosto de Camilo. Abriu uma gaveta e tirou um baralho de cartas compridas e enxovalhadas. Enquanto as baralhava, rapidamente, olhava para ele, não de rosto, mas por baixo dos olhos. Era uma mulher de quarenta anos, italiana, morena e magra, com grandes olhos sonsos e agudos. Voltou três cartas sobre a mesa, e disse-lhe:
— Vejamos primeiro o que é que o traz aqui. O senhor tem um grande susto...
Camilo, maravilhado, fez um gesto afirmativo.
— E quer saber, continuou ela, se lhe acontecerá alguma cousa ou não...
— A mim e a ela, explicou vivamente ele.
A cartomante não sorriu: disse-lhe só que esperasse. Rápido pegou outra vez das cartas e baralhou-as, com os longos dedos finos, de unhas descuradas; baralhou-as bem, transpôs os maços, uma, duas. três vezes; depois começou a estendê-las. Camilo tinha os olhos nela. curioso e ansioso.
— As cartas dizem-me...
Camilo inclinou-se para beber uma a uma as palavras. Então ela declarou-lhe que não tivesse medo de nada. Nada aconteceria nem a um nem a outro; ele, o terceiro, ignorava tudo. Não obstante, era indispensável muita cautela: ferviam invejas e despeitos. Falou-lhe do amor que os ligava, da beleza de Rita. . . Camilo estava deslumbrado. A cartomante acabou, recolheu as cartas e fechou-as na gaveta.
— A senhora restituiu-me a paz ao espírito, disse ele estendendo a m ão por cima da mesa apertando a da cartomante. Esta levantou-se, rindo.
— Vá, disse ela; vá, ragazzo innamo rato...
E de pé, com o dedo indicador, tocou-lhe na testa. Camilo estremeceu, como se fosse a mão da própria sibila, e levantou-se também. A cartomante foi à cômoda, sobre a qual estava um prato com passas, tirou um cacho destas, começou a despencá-las e comê-las, mostrando duas fileiras de dentes que desmentiam as unhas. Nessa mesma ação comum, a mulher tinha um ar particular. Camilo, ansioso por sair, não sabia como pagasse; ignorava o preço.
— Passas custam dinheiro, disse ele afinal, tirando a carteira. Quantas quer mandar buscar?
— Pergunte ao seu coração, respondeu ela.
Camilo tirou uma nota de dez mil-réis, e deu-lha. Os olhos da cartomante fuzilaram. O preço usual era dois mil-réis.
— Vejo bem que o senhor gosta muito dela... E faz bem; ela gosta muito do senhor. Vá, vá, tranquilo. Olhe a escada, é escura; ponha o chapéu...
A cartomante tinha já guardado a nota na algibeira, e descia com ele, falando, com um leve sotaque. Camilo despediu-se dela embaixo, e desceu a escada que levava à rua, enquanto a cartomante, alegre com a paga, tornava acima, cantarolando uma barcarola. Camilo achou o tílburi esperando; a rua estava livre. Entrou e seguiu a trote largo.
Tudo lhe parecia agora melhor, as outras cousas traziam outro aspecto, o céu estava límpido e as caras joviais. Chegou a rir dos seus receios, que chamou pueris; recordou os termos da carta de Vilela e reconheceu que eram íntimos e familiares. Onde é que ele lhe descobrira a ameaça? Advertiu também que eram urgentes, e que fizera mal em demorar-se tanto; podia ser algum negócio grave e gravíssimo.
— Vamos, vamos depressa, repetia ele ao cocheiro.
E consigo, para explicar a demora ao amigo, engenhou qualquer cousa; parece que formou também o plano de aproveitar o incidente para tornar à antiga assiduidade... De volta com os planos, reboavam-lhe na alma as palavras da cartomante. Em verdade, ela adivinhara o objeto da consulta, o estado dele, a existência de um terceiro; por que não adivinharia o resto? O presente que se ignora vale o futuro. Era assim, lentas e contínuas, que as velhas crenças do rapaz iam tornando ao de cima, e o mistério empolgava-o com as unhas de ferro. Às vezes queria rir, e ria de si mesmo, algo vexado; mas a mulher, as cartas, as palavras secas e afirmativas, a exor-tação: — Vá, vá, ragazzo innamorato; e no fim, ao longe, a barcarola da despedida, lenta e graciosa, tais eram os elementos recentes, que formavam, com os antigos, uma fé nova e vivaz.
A verdade é que o coração ia alegre e impaciente, pensando nas horas felizes de outrora e nas que haviam de vir. Ao passar pela Glória, Camilo olhou para o mar, estendeu os olhos para fora, até onde a água e o céu dão um abraço infinito, e teve assim uma sensação do futuro, longo, longo, interminável.
Daí a pouco chegou à casa de Vilela. Apeou-se, empurrou a porta de ferro do jardim e entrou. A casa estava silenciosa. Subiu os seis degraus de pedra, e mal teve tempo de bater, a porta abriu-se, e apareceu-lhe Vilela.
— Desculpa, não pude vir mais cedo; que há?
Vilela não lhe respondeu; tinha as feições decompostas; fez-lhe sinal, e foram para uma saleta interior. Entrando, Camilo não pôde sufocar um grito de terror: — ao fundo sobre o canapé, estava Rita morta e ensanguentada. Vilela pegou-o pela gola, e, com dois tiros de revólver, estirou-o morto no chão.
A CARTOMANTE – QUESTÕES
1-A trama gira em torno de quais personagens?
2-Quais as características psicológicas dos
personagens?
3-Qual o enredo da história?
4-O narrador do conto é personagem ou observador?
5-Qual fato acontecido na história que fez com que
Camilo e Rita se aproximassem ainda mais?
6-Qual o ambiente onde se passa a história?
7-Como o narrador apresenta os personagens em
relação a suas profissões?
8-Qual o ponto máximo da narrativa?
9-A Cartomante falou a verdade a Camilo? Explique.
10-Quais os objetivos da citação de Shakespeare no
início do conto?
11-Mesmo não muito claro na história em sua opinião
que enviava os bilhetes anônimos?
12. Você observou que esse conto não é narrado numa
sequência linear - começo, meio e fim. O início do conto que mostra o diálogo
entre Camilo e Rita sobre a cartomante, já nos apresenta a trama perto de seu
desfecho. Localize a passagem em que o narrador faz um corte no presente e
volta ao passado para explicar quem são as personagens centrais e como chegaram
à situação em que se encontram.
13. O que você entende da frase dita por Hamlet(Hamlet é personagem da peça teatral Hamlet, o príncipe da Dinamarca, do escritor britânico William Shakespeare) e mencionada no texto: "Há mais coisas no céu e na terra do que sonha a nossa filosofia"?
14. Quando uma pessoa não acredita em nada, diz-se que ela é cética. O ceticismo está presente nos textos machadianos. Nesse conto, de que maneira aparece esse ceticismo?
15. Faça a descrição física e psicológica das personagens que fazem parte do triângulo amoroso do conto.
16. Quem, segundo o narrador, é o responsável pela continuidade do envolvimento de Rita e Camilo?
17. Que comparação o narrador utiliza para se referir ao comportamento de Rita?
18.Você gostou do conto? Justifique sua resposta. Que tal ler outros contos de Machado de Assis?
19. Qual o desfecho do conto? Você gostou? Por quê?
20.. Substitua as palavras destacadas em destaque nas frases por sinônimos.
a- "Vilela seguiu a carreira de magistrado."
b- "Vilela cuidou do enterro, dos sufrágios e do inventário..."
c- "...a virtude é preguiçosa e avara, não gasta tempo nem papel; só o interesse é ativo epródigo."
d- "Voltou à rua, e a ideia de estarem descobertos parecia-lhe cada vez mais verossímil..."
21. A Cartomante é uma obra realista. Aponte as características do Realismo presente no texto de Machado de Assis.
13. O que você entende da frase dita por Hamlet(Hamlet é personagem da peça teatral Hamlet, o príncipe da Dinamarca, do escritor britânico William Shakespeare) e mencionada no texto: "Há mais coisas no céu e na terra do que sonha a nossa filosofia"?
14. Quando uma pessoa não acredita em nada, diz-se que ela é cética. O ceticismo está presente nos textos machadianos. Nesse conto, de que maneira aparece esse ceticismo?
15. Faça a descrição física e psicológica das personagens que fazem parte do triângulo amoroso do conto.
16. Quem, segundo o narrador, é o responsável pela continuidade do envolvimento de Rita e Camilo?
17. Que comparação o narrador utiliza para se referir ao comportamento de Rita?
18.Você gostou do conto? Justifique sua resposta. Que tal ler outros contos de Machado de Assis?
19. Qual o desfecho do conto? Você gostou? Por quê?
20.. Substitua as palavras destacadas em destaque nas frases por sinônimos.
a- "Vilela seguiu a carreira de magistrado."
b- "Vilela cuidou do enterro, dos sufrágios e do inventário..."
c- "...a virtude é preguiçosa e avara, não gasta tempo nem papel; só o interesse é ativo epródigo."
d- "Voltou à rua, e a ideia de estarem descobertos parecia-lhe cada vez mais verossímil..."
21. A Cartomante é uma obra realista. Aponte as características do Realismo presente no texto de Machado de Assis.
Assinar:
Postagens (Atom)